sexta-feira, 24 de outubro de 2014

Lixo Hospitalar: Incineração, poluição ou efetividade?

Seringas contaminadas por sangue, gases utilizadas em curativos, restos de tecidos/órgãos, fluidos orgânicos, sondas, medicamentos vencidos, lençóis, sobras de alimentos, papeis sanitários e fraldas, copos descartáveis, ampolas, bisturis, bolsas de coleta, insumos radioativos, hemoderivados e culturas laboratoriais são alguns dos materiais encontrados no LIXO HOSPITALAR. Mas como descartar estes compostos, se os mesmos podem causar grandes prejuízos ao meio ambiente e ao ser humano??? 
Seguir a legislação vigente é um bom começo para o caminho certo. A ANVISA - Agência Nacional de Vigilância Sanitária, aprovou em 07 de dezembro de 2004 a Resolução da Diretoria Colegiada – RDC nº 306, que dispõe sobre o Regulamento Técnico para o gerenciamento de resíduos de serviços de saúde, considerando os princípios da biossegurança de empregar medidas técnicas, administrativas e normativas para prevenir acidentes, preservando a saúde pública e o meio ambiente.
Tal resolução classifica os resíduos em 05 grandes grupos nomeados de A a E:
Grupo A (potencialmente infectantes): todos os resíduos que tenham presença de agentes biológicos que apresentam risco de infecção, como bolsas de sangue, vísceras, fluidos orgânicos com suspeita de contaminação com proteína priônica. Subdividem-se de A1 a A7.
A1 - Culturas e estoques de agentes infecciosos de laboratórios industriais e de pesquisa; resíduos de fabricação de produtos biológicos;
A2 - Bolsas contendo sangue ou hemocomponentes vencidas, contaminadas, com volume superior a 50 ml; kits de aférese;
A3 - Peças anatômicas e produto de fecundação com peso menor que 500g ou estatura menor que 25 cm;
A4 - Carcaças, peças anatômicas e vísceras de animais de estabelecimentos de tratamento de saúde animal, de universidades, de centros de experimentação;
A5 - Resíduos provenientes de pacientes suspeitos de ou que contenham agentes de risco classe IV ou relevância epidemiológica ou risco de disseminação;
A6 - Kits de linhas arteriais e venosas e dialisadores descartados e filtros de ar e gases oriundos de áreas críticas;
A7 - órgãos, tecidos e fluidos orgânicos com suspeita de contaminação com proteína priônica e resíduos sólidos resultantes da atenção à saúde de indivíduos com suspeita de contaminação com proteína priônica;
Grupo B (químicos): resíduos que contenham substâncias químicas capazes de causar risco à saúde e/ou ao meio ambiente, independente de suas características inflamáveis, reativas, tóxicas e corrosivas. Por exemplo: medicamentos para tratamento de câncer, reagentes para laboratório e substâncias para revelação de filmes de Raio-X;
Grupo C (rejeitos radioativos): resíduos que apresentem radioatividade acima dos padrões e não possam ser reaproveitáves, como exames de medicina nuclear.
Grupo D (resíduos comuns): resíduos não contaminados ou que não acarretem risco de acidentes, como alimentos, copos descartáveis, papel.
Grupo E (Perfurocortantes): resíduos que possam cortar ou perfurar, como bisturis, agulhas, ampolas.
É importante salientar, que determinados resíduos apresentam mais de uma característica enquadrando-se em diversos grupos, mas sua característica mais prevalente irá proporcionar a classificação mais adequada.
De acordo com a sua classificação, a resolução prevê a sua destinação:
Grupo A
Tratamento específico para transformar em resíduo comum, de acordo com a classificação A1 a A7.
A1
Tratamento prévio na unidade geradora
A2
Acondicionamento em saco branco leitoso e aterro sanitário
A3
Enterramento ou saco branco leitoso e aterro sanitário
A4
Enterramento ou saco branco leitosoe aterro sanitário
A5
Autoclavação na unidade geradora e incineração. Manuseio com EPI para classe Risco IV
A6
Acondicionamento em saco branco leitoso,e disposição em aterro sanitário
A7
Incineração e acondicionamento em saco branco leitoso.
Grupo B
Devolver ao fabricante ou importador
Grupo C
Rregulamentação específica da Comissão Nacional de Energia Nuclear, cabendo ao hospital realizar o procedimento e a destinação final de acordo com essa especificação.
Grupo D
Acondicionamento em saco plástico preto e deposição em aterro sanitário.
Grupo E
Acondicionado no local de geração e recipientes rígidos, e deposição em aterro sanitário.

Um dos tratamentos para destinação final destes resíduos consiste na incineração, que apresenta seus pontos positivos e negativos, gerando muitas polêmicas acerca deste procedimento, mas os sistemas de tratamento térmico por incineração devem obedecer ao estabelecido na Resolução CONAMA nº. 316/2002.
A incineração é a queima dos compostos orgânicos a elevadas temperaturas entre 850º C a 1.200ºC, que resulta em cinzas, vapor d’água, gás carbônico (dióxido de carbono), e outras substâncias poluentes e tóxicas.
Um dos pontos positivos, é que após a queima o lixo reduz cerca de 70% do seu volume inicial. Outro fator representa uma forma segura de eliminar substâncias potencialmente perigosas, que vão desde medicamentos vencidos até material contaminado, pois a incineração desnatura proteínas e ácidos nucleicos de agentes patogênicos pelo calor.
O grande problema consiste nos poluentes emitidos pela queima, que produz dióxido de carbono, que é produzido em toda combustão completa de materiais orgânicos (relacionado ao efeito estufa, como dito na postagem anterior), dióxido de enxofre (SO2) e dióxido de nitrogênio (NO2), que contribuem para a formação de chuvas ácidas. Também são gerados os polímeros, tais como o PVC (policloreto de vinila) e os poliacrilatos, geram respectivamente HCl e HCN.
Sem dúvidas o maior poluente são as dioxinas, um grupo de compostos organoclorados que são bioacumulativos e tóxicos, resultantes da incineração do PVC, muito presente em artigos hospitalares. O mais perigoso é o 2,3,7,8-TCDD (2,3,7,8-tetraclorodibenzo-p-dioxina):

Figura 1. Estrutura da principal dioxina: TCDD
Outro fato bastante preocupante relaciona-se ao risco que os profissionais envolvidos no processo de incineração estão submetidos, sendo indispensável a uso de Equipamentos de Proteção Individual (EPI), infraestrutura adequada aos processos e conhecimento técnico-científico para manuseio destes resíduos.
Apesar de todos os perigos envolvidos, a incineração de resíduos hospitalares, representa atualmente a forma mais adequada de minimizar riscos hospitalares, principalmente com o advento dos filtradores dos complexos poluentes, proporcionando uma transformação da poluição em energia ou algo mais útil e proveitoso.
Ainda sim, a grande barreira a ser vencida é bem maior que algo físico, é algo financeiro, pois a instalação e manutenção de incineradores demandam grandes recursos financeiros que muitas vezes nem a entidade pública nem a privada quem investir. Outro fator está relacionado à educação continuada, pois os profissionais de saúde em todos os níveis devem estar capacitados sobre a correta segregação dos resíduos sólidos.

Afinal de que adianta um destino adequado ao resíduo incorreto ??

"Promover saúde é desde um sorriso até jogar uma embalagem de bombom no lixo!"

VRANJAC, Alexandre. Resíduos em Serviços de Saúde – O que o controlador de infecção hospitalar precisa saber; Centro de Vigilância Epidemiológica. 2004 
Substâncias tóxicas formadas na incineração do lixo. Disponível em http://www.mundoeducacao.com/quimica/substancias-toxicas-formadas-na-incineracao-lixo.htm Acesso em 24 Out 2014.
Anvisa estabelece regras para descarte de lixo hospitalar. Disponível em http://www.hospitalar.com/arquivo_not/not1019.html Acesso em 24 Out 2014.

Descarte de resíduos e lixos hospitalares. Disponível em http://www.dinamicambiental.com.br/blog/lixo-hospitalar/descarte-de-residuos-e-lixos-hospitalares/ Acesso em 24 Out 2014

sábado, 18 de outubro de 2014

O Lixo e o Biogás

Conforme citado anteriormente, o lixo não apresenta apenas malefícios, possui também benefícios, como o uso do lixo orgânico na produção de fertilizantes, que em geral, apresenta mais benefícios e vantagens que agrotóxicos. Outra forma de aproveitamento do lixo orgânico pouco utilizado é a produção de biogás, que consiste na decomposição da material animal e/ou vegetal gerando gás metano em especial, processo chamado biodigestão ou digestão anaeróbica.
Existem biodigestores naturais por excelência, como por exemplo, o solo, e também biodigestores artificiais produzidos pelo homem para maximizar e acelerar tal processo, que são câmaras fechadas, de fabricação relativamente simples, onde as bactérias iram atuam no processo de decomposição.
O gás de aterro é produzido pela decomposição anaeróbica (sem a presença de oxigênio) por bactérias, através da fermentação de resíduos orgânicos (restos de plantas, dejetos de animais, restos de alimentos e efluentes das indústrias). Este gás é composto por aproximadamente 50% de metano (CH4), 40% de dióxido de carbono (CO2), 9% de nitrogênio, e concentrações residuais de compostos orgânicos voláteis, poluentes perigosos e outros elementos. (Silva, 2008).
Os dióxidos de carbono, o metano e o nitrogênio combinado com outras moléculas formando o óxido nitroso, liberados pelos aterros sanitários, são responsáveis também pelo aumento da temperatura do Efeito Estufa, pois representam uma das maiores fontes de emissão do metano, configurando mais uma vez a maleficência do lixo quando não aproveitado de maneira correta no meio ambiente.
A captação e utilização do metano em aterros é favorável, pois reduz os gases do efeito estufa, pode ser utilizado como substrato para biocombustíveis (etanol, metanol e biodiesel), além do metano possuir grande energia contida em seus átomos, proporcionando a sua utilização na produção de energia elétrica, resultando em uma menor sobrecarga de outros sistemas de produção elétrica, como o sistema hidroelétrico que devasta grande áreas biológicas, podendo proceder de duas formas:
Gaseificação: através da combustão dentro motogeradores que movem turbinas, transformando energia mecânica em energia elétrica;
Pirólise fornecimento de calor que através da reação química, é convertida em óleo, que será queimado para a produção de energia elétrica;
Utilização do Biogás
É importante salientar, que antes do biogás ser utilizado pela sua finalidade, é indispensável uma purificação, reduzindo a concentração de substâncias corrosivas, tal como o ácido sulfídrico, ou a separação em dióxido de carbono e metano, pois o dióxido de carbono tem um efeito de diluição no biogás, reduzindo seu poder energético.
Uma informação bastante relevante refere-se ao fato da biodigestão ser também uma forma de gerar créditos de carbono, metodologia que tem por objetivo reconhecer métricas que contribuam para o controle e redução das emissões de GEEs. Cada tonelada de carbono retirada da atmosfera ou deixada de ser produzida equivale a um crédito de carbono, que pode ser comercializado no mercado internacional. Dessa forma, os resíduos se convertem em uma fonte de renda para os municípios, podendo acarretar em diminuição de impostos. Além disso, é um Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), que visa crescimento econômico mais sustentável. (Ecycle, 2010-2013).
Assim, podemos analisar que a biodigestão apresenta um vasto e amplo cunho financeiro e político, pois muitas vezes as autoridades públicas podem estar criando novos biodigestores apenas por barganho no sistema de créditos de carbono, consequentemente gerando novos empregos, mas não pensando no meio ambiente, e sim pelo impacto midiático que a ação proporciona.
Mais uma vez, reafirma-se a importância da Educação Ambiental, principalmente quanto à segregação adequada do lixo, que será uma das primeiras etapas do processo indispensável para o destinação adequada dos resíduos, seja para uma compostagem, um biodigestor, uma cooperativa de reciclagem, ou seja lá qual for o seu destino.

Para que o lixo não seja lixo, ele precisa da sua ajuda!

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
SILVA, Tiago Nascimento; CAMPOS, Lucila Maria de Souza. Avaliação da produção e qualidade do gás de aterro para energia no aterro sanitário dos Bandeirantes - SP. Eng. Sanit. Ambient.,  Rio de Janeiro ,  v. 13, n. 1, Mar.  2008 .   Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-41522008000100012&lng=en&nrm=iso>. access on  18  Oct.  2014
ECYCLE, Sua pegada mais leve. Biodigestão é opção para grandes quantidades de lixo orgânico rural e urbano. Disponível em http://www.ecycle.com.br/component/content/article/35-atitude/1338-biodigestao-e-uma-opcao-para-o-lixo-organico-rural-e-urbano.html#header. Acesso em 18 Out. 2014.

Biogás e o Gás Natural. http://www.feg.unesp.br/emas/vigilantes/Fontes_de_Energia/biogas.htm Acesso em 18 Out. 2014.

quinta-feira, 9 de outubro de 2014

O Lixo Benéfico

Inicialmente, tentou-se inserir um conceito prévio sobre o lixo e quais as suas principais complicações quando acomodado e depositado de maneira inadequada, ressaltando a contaminação aquífera ocasionada por lixões clandestinos ou sem condições adequadas.
Mas será que o lixo só produz malefícios? Será que ele pode beneficiar o meio ambiente de alguma forma? E o ser humano, como colaborar com esta problemática?

Vamos ver um vídeo acerca dos caminhos que o lixo domiciliar pode percorrer!


Conforme supracitado pelo vídeo, o lixo domiciliar pode ser organizado basicamente em lixo orgânico e lixo não orgânico (seco ou reciclável), e cada um recebe um tratamento e destino diferente de acordo com as sua propriedades. Além do aterro sanitário ou lixão, o lixo orgânico pode ser aproveitado de forma benéfica e colaborativa com o meio ambiente, por meio do processo de compostagem e posterior aplicação agrícola, que desencadeiam inúmeros fatores benéficos ao solo e, sobretudo uma maneira eficiente de reduzir o volume de material destinado aos aterros sanitários, pois cerca de 50 a 60% dos resíduos domiciliares é material orgânico. (Saborano, 2006)
O composto de lixo orgânico é um material orgânico rico em nutrientes, apresentando 389 g kg-1 de matéria orgânica, elevado teor de nitrogênio (11,5 g kg-1), baixos teores de fósforo (2,2 g kg-1), potássio, magnésio e enxofre (3,3; 1,5 e 1,2 g kg-1, respectivamente) além de elevados teores de cálcio e sódio (19,1e 1,785 g kg-1) (Almeida, 2003). Apesar de apresentar elevados teores de metais pesados, como zinco (475 mg kg-1), cobre (230 mg kg-1), manganês (245 mg kg-1), níquel (12,7 mg kg-1), chumbo (158 mg kg-1 ) e cádmio (5,08 mg kg-1) (Fachini et al., 2004), após a compostagem adequada, os teores de metais pesados estavam abaixo dos limites estabelecidos pela NBR 10004 – Resíduos Sólidos, da Associação Brasileira de Normas Técnicas.
Diversos autores destacam a melhoria das propriedades físicas e químicas do solo e o do desenvolvimento das plantas, associados principalmente à alta concentração de presente no composto de lixo urbano que exalta o seu potencial agronômico, visto que a adição de quantidades superiores a 20 t ha-1 proporcionou o aumento da CTC (capacidade de troca catiônica) do solo em consequência do incremento no teor de carbono orgânico e nos valores de pH.
Dois elementos merecem destaque, pelos efeitos produzidos no solo, quando aplicados como fertilizantes orgânicos provenientes do lixo orgânico compostado:
-Sódio (Na): Em condições acentuadas, pode provocar efeitos deletérios, por meio da inibição de reações enzimáticas, ocasionadas pela desnaturação proteica, que é a perda/desorganização de estruturas quaternárias, terciárias e/ou secundárias. O sódio também pode penetrar entre o citoplasma e o vacúolo, podendo gerar uma desidratação e turgescência da célula, que pode ocasionar morte de folhas e ramos.
-Nitrogênio (N): A relação simbiótica entre plantas leguminosas e bactérias fixadoras de nitrogênio nos nódulos de suas raízes é colaborada pelo alto teor de nitrogênio disponível na fertilização proveniente da compostagem do lixo orgânico.
As bactérias nos nódulos das raízes tem acesso a grandes quantidades de energia na forma de carboidratos e intermediários do ciclo do ácido cítrico, disponibilizados pela planta, permitindo-a fixar mais nitrogênio do que realizaria em condições encontradas normais do solo. Os bacteroides produzem complexos da nitrogenase, que converte nitrogênio atmosférico (N2) em amônio (NH₄⁺); sem os bacteriodes, a planta é incapaz de utilizar N2. A célula infectada da raiz fornece alguns fatores essências para a fixação de nitrogênio, como a leg-hemoglobina, heme-proteína de alta afinidade de ligação pelo oxigênio, que é forte inibidor da nitrogenase.
O enriquecimento causado pelo nitrogênio é a base dos métodos de rotação de culturas, nos quais o cultivo de plantas não leguminosas, como o milho, que extraem do solo o nitrogênio fixado, e alternado a cada poucos anos com o cultivo de legumes.
Destacados os benefícios que o lixo orgânico pode trazer para o meio ambiente, em especial ao solo e a agricultura, cabe a cada um de nós promovermos a coleta seletiva e cobrar dos órgãos competentes o melhor aproveitamento desses resíduos, permitindo assim a não poluição dos recursos naturais e a contribuição para a nossa alimentação, pois a utilização de fertilizantes orgânicos biológicos substitui a necessidade de fertilizantes agroindustriais ou produtos transgênicos!

“O errado é errado mesmo que todo mundo esteja fazendo.
O certo é certo mesmo que ninguém esteja fazendo.”
Pense certo e faça a coleta seletiva. O seu futuro agradece!

Referências Bibliográficas
LIMA, Rosiane L. S et al . Atributos químicos de substrato de composto de lixo orgânico. Rev. bras. eng. agríc. ambient.,  Campina Grande ,  v. 15, n. 2, Feb.  2011 .   Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415-43662011000200012&lng=en&nrm=iso>. access on  09  Oct.  2014.  

NELSON, D. L.; COX, M. M. Princípios de Bioquímica de Lehninger. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2011.

TEIXIRA, Leopoldo Brito; OLIVEIRA, Raimundo Freire de; GERMANO, Vera Lúcia Campos; FURLAN JÚNIOR, José Furlan, Júnior; Composição Química de Composto de Lixo Orgânico Urbano de Barbacena; Setembro, 2002. Belém, PA. (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento; Comunicado Técnico 71).

quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Contaminação Aquífera

“Estava lanchando uma coca-cola lata com um biscoito integral, em uma das lanchonetes da universidade. Após finalizar o lanche, permaneci ali por alguns instantes, conversando com os amigos da turma sobre a bioquímica, e então voltamos para a sala de aula. Percebi que tinha esquecido minha garrafa de água, e voltei à lanchonete, deparando-me com uma moça que estava a limpando a mesa, separando os resíduos em metal, plástico, papel e restos de comida. A mesma me entregou a garrafa, agradeci e retornei a sala, porém refletindo sobre o destino final daquele lixo e qual a sua real importância, principalmente para o meio ambiente. Será que há bioquímica no lixo?”
Para entender sobre a bioquímica do lixo, é indispensável destacar o que é bioquímica e o que é lixo, e como ambas se correlacionam:
Segundo Lehninger, “Bioquímica não é nada menos do que a “Química da Vida” e, portanto, a vida pode ser investigada, analisada e compreendida”. Esta definição permite definir bioquímica como todo o processo químico que interfere, interage ou colabora com a vida direto ou indiretamente. Por sua vez, do latim lix, a palavra lixo significa "cinzas". De acordo com o Dicionário Aurélio, lixo é "tudo o que não presta e se joga fora; coisa ou coisas inúteis, velhas, sem valor; resíduos que resultam de atividades domésticas, industriais, comerciais", mas este conceito apresenta um valor subjetivo quando se verifica a atual cojuntura socioeconômica, em que muitas pessoas se alimentam e sobrevivem do lixo, utilizando-o de alguma forma, sendo assim, não se trata de lixo para estas pessoas, mas o ponto de início de uma cadeia/ciclo.
Aterro Sanitário Legalizado, conforme Política Nacional de
Resíduos Sólidos, Lei 12.305 de 2 de Agosto de 2010.
Segundo a Política Nacional de Resíduos Sólidos, a proteção da saúde pública e da qualidade ambiental, a não geração, redução, reutilização, reciclagem e tratamento dos resíduos sólidos, bem como disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos, são objetivos almejados, porém, tais práticas tornam-se quase utopias, principalmente quando a coleta do lixo ocorre de maneira indiscriminada, aleatória, sem o menor preparo e cuidado, não deixando de salientar, a disposição final, que na maioria das vezes, ocorre em locais com condições inadequadas, sem um preparo do solo, próximo de regiões aquíferas, com vegetação nativa em crescimento, dentre outras.
Lixão Clandestino do Projeto Manuzelão da UFMG
Responsável por denúncias a lixões clandestinos
Estudos acerca da qualidade do solo e da água, próximo de locais de aterros sanitários, como realizado no Município de Alagoinhas (Bahia), apontam a existência de uma severa contaminação das águas subterrâneas e superficiais. Verificaram-se alterações nas demandas químicas e bioquímica de oxigênio (DQO e DBO), dos nutrientes nitrogênio e fósforo, no total de sólidos dissolvidos e suspensos, nos totais de cátions e ânions, além da contaminação pelo metal cromo III, apresentando fortes indícios de contaminação com lixiviados de lixo (lixiviados são efluentes líquidos resultantes da água contida nos resíduos, da chuva ou de infiltrações).
As concentrações de sulfato e de cloreto estavam normais em alguns pontos, mas em outros estavam acima do normal. O sulfato em excesso, possui efeitos laxativos, e em situação anaeróbicas, pode ser reduzido a sulfeto, que em excesso provoca irritação nos olhos e no aparelho respiratório, dores de cabeça e cegueira temporária. Já o cloreto está associado a alterações na pressão osmótica das células e ao padrão de potabilidade da água, pelo seu caráter “salgado”.
Os resultados de DBO e DQO associados a alterações na concentração de nutrientes do fósforo e nitrogênio demonstram uma alta depleção do oxigênio dissolvido, implicando um processo de eutrofização que quebra a estabilidade (homeostase) do equilíbrio entre a produção e o consumo e decomposição da matéria orgânica, assim, o ecossistema produz mais do que sua capacidade de consumir, resultando o aparecimento de algas filoplantctônicas e perda da biodiversidade.
Alterações na concentração do metal cromo, provenientes do despejo de resíduos industriais na bacia aquífera, principalmente pelo curtume de couro, interferem em processos enzimáticos, e na sua pouca mobilidade no organismo vivo, pelo pequeno tamanho e das cargas elétricas duplas e triplas. A baixa mobilidade ocasiona um acúmulo, que causa grandes modificações no metabolismo, levando até a morte. Através das cadeias alimentares, estes elementos podem atingir o ser humano, causando efeitos cumulativos mais devastadores, pelas consequências da contaminação.
Destacadas algumas consequências do processo de contaminação do perímetro aquífero, pela presença de aterros sanitários ou lixões, é imprescindível que exista um controle rigoroso e constante sobre o manuseio do lixo, desde a sua segregação até a disposição final, pois os efeitos são revertidos para o meio ambiente de forma abrupta e na maioria das vezes, o próprio ser humano sente as consequências bioquímicas do acondicionamento inadequado dos seus resíduos.
Não percam as próximas postagens da Bioquímica do Lixo...!

Referências Bibliográficas

NELSON, D. L.; COX, M. M. Princípios de Bioquímica de Lehninger. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2011.

PEREIRA, Patrícia de Andrade; LIMA, Olivar Antônio Lima de. Estrutura elétrica da contaminação hídrica provocada por fluidos provenientes dos depósitos de lixo urbano e de um curtume no município de Alagoinhas, Bahia. Rev. Bras. Geof.,  São Paulo ,  v. 25, n. 1, mar.  2007 .   Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-261X2007000100001&lng=pt&nrm=iso>. acessos em  01  out.  2014.  

BRASIL. Lei 12.305, de 2 de Agosto de 2010. Institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos; altera a Lei no 9.605, de 12 de fevereiro de 1998; e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/lei/l12305.htm>. Acesso em 01/10/2014


MACHADO, Nilson José; CASADEI, Silmara Rascalha; Seis razões para diminuir o lixo no mundo; ilustrações Vera Andrade – São Paulo: Escrituras Editora, 2007. (Coleção escritinha).